Boa parte do meu trabalho de desenvolvedor de conteúdos sobre as mudanças, gestão e pessoas se dá através de pesquisas que servem para confirmar, ou mesmo confrontar, as percepções existentes sobre temas contemporâneos. Um dos assuntos que têm desafiado as empresas e profissionais na atualidade é o trabalho remoto e como os líderes estão conseguindo comandar suas equipes à distância. Em tempos do crescimento acentuado do home-office, essa prática pegou de surpresa muitos gestores que não estavam preparados. O trabalho remoto não é novidade. Muitas empresas já possuíam esse modelo de gestão antes mesmo da pandemia, mas, sem dúvida, o número aumentou expressivamente em 2020.
Uma pesquisa da Fundação Instituto de Administração (FIA), realizada em abril de 2020 com 139 empresas brasileiras, demonstrou que 46% dos funcionários trabalhavam em cargos passíveis de home office e, por conta da pandemia, 41% passou a trabalhar de casa.
Para entender mais sobre o assunto eu fiz pesquisas de campo e bibliográficas e levantei algumas informações relevantes.
Em agosto e setembro de 2020 conduzi uma pesquisa pela Universidade da Mudança sobre liderança remota que contou com a resposta de 85 líderes e profissionais de RH e, além de algumas questões abertas, também usou afirmativas com respostas em escala de concordância (tipo escala de Likert com 4 classificações, 2 positivas e 2 negativas, sem ponto neutro).
Percebemos, resumidamente, que alguns temas ainda são desafiadores para liderança remota, enquanto outros assuntos têm sido mais facilmente abordados nas empresas. Na nossa pesquisa ficou claro que os dois maiores problemas da liderança remota estão relacionados à comunicação e à orientação para resultados.
A afirmação “o líder tem conseguido se comunicar de maneira adequada e eficaz” ficou em segundo lugar entre os maiores problemas da liderança remota e “o líder tem sido mais orientando às entregas de resultados do que o foco em tarefas e o cumprimento rígido de horário de trabalho” apareceu como o ponto com maior oportunidade de melhoria.
Nas questões abertas, que evidenciam os acertos e os erros dos líderes, os pontos acima foram confirmados, sendo possível perceber claramente que o distanciamento social, os mecanismos utilizados e o excesso de demandas de ambas as partes (líderes e liderados) têm dificultado a comunicação. Por outro lado, é perceptível que as lideranças têm bons resultados nas ações que requerem confiança nas equipes, empatia e flexibilidade.
A comunicação sempre foi um problema antes mesmo da utilização ampliada do trabalho à distância. A falta de feedback e de clareza nas expectativas dos resultados esperados já era algo comumente reclamado por liderados. A liderança remota ampliou. Da mesma forma a empatia, flexibilidade e confiança nas pessoas já são traços naturais dos líderes tupiniquins e foram expandidos nesse momento.
Outras pesquisas conduzidas brilhantemente por institutos de pesquisas e consultorias também revelam dados relevantes. Um recente estudo da consultoria brasileira AL+ People & Performance Solutions, publicado pela Infomoney, apresentou a informação de que 33,9% dos executivos entrevistados disseram que o maior obstáculo para a gestão remota de pessoas foi manter uma cultura organizacional e 25,4% afirmaram que uma das dificuldades é manter o engajamento à distância. A pesquisa, realizada em agosto de 2020, contou com 177 executivos entrevistados entre CEOs, acionistas e empresários.
Essa pesquisa também trouxe algumas constatações positivas, pois, 31% dos entrevistados afirmam que um dos maiores aprendizados foi perceber que o home office, que demanda a liderança remota, era viável.
No início da pandemia várias organizações não acreditavam que o trabalho remoto pudesse gerar resultados ou que os funcionários conseguissem ser produtivos. Cerca de 68% dos líderes pesquisados afirmaram que essa metodologia de trabalho em casa está funcionando perfeitamente durante a pandemia. A pesquisa da FIA que citamos no início desse texto informa que cerca de 94% das empresas brasileiras afirmam que atingiram ou superaram suas expectativas de resultados com o home office.
Não é à toa que muitas empresas têm divulgado que adotarão o home office permanentemente, seja na totalidade ou com modelos híbridos de trabalho. Petrobras, XP Inc. e Twitter são algumas das que informaram que parte da equipe administrativa poderá optar pelo trabalho remoto, mesmo quando passar a pandemia.
A ideia ganha força entre os funcionários. Uma pesquisa conduzida pelo professor André Fischer da FIA, apontou que 70% das pessoas gostariam de permanecer em regime de home office integral ou parcial, segundo uma notícia publicada no UOL.
Algo chama a atenção nesse novo contexto. Com a ampliação das possibilidades à distância muitos líderes precisarão reinventar suas condutas de gestão. Para o sucesso na liderança remota, um dos pontos essenciais deve ser a comunicação de mão dupla. A comunicação é a ferramenta maior de um líder e, nesse momento de comunicação remota, a chefia precisa ser cuidadosa e dedicada a esse ponto de atenção.
Gosto de explicar essa comunicação da liderança através desse esquema:
A figura mostra os dois conjuntos de ações que os líderes devem focar para exercerem uma boa liderança remota.
O conjunto da esquerda mostra os acordos que devem existir entre o líder e o liderado. Com essas ações é possível empoderar a equipe com maior foco nos resultados do que nas tarefas. O conjunto da direita apresenta as ações cotidianas para manter a moral da equipe e a comunicação aberta.
Nos itens a serem previamente acordados entre os líderes e liderados estão:
Resultados:
É necessário ao líder clarificar quais resultados são desejados com determinado projeto ou ação. No trabalho remoto o controle das tarefas se tornam menos relevantes que os objetivos a serem alcançados.
Recursos/condições:
É preciso definir quais recursos estarão disponíveis para que os resultados sejam alcançados e as condições para obtê-los. Cabe ao líder também ouvir os liderados para saber quais ferramentas ou informações estariam faltando e, por isso, limitando a ação.
Limites:
Quais as regras e limites que devem ser respeitados e seguidos por todos?
Preferência:
Remotamente a dinâmica do trabalho é diferente, principalmente quando o liderado trabalha em casa junto com a família. A dinâmica do cotidiano impacta diretamente, por isso as partes devem combinar as preferências de horários para reuniões, comunicações, intervalos, entre outras, sempre quando for possível.
Priorização:
Algo muito importante para o colaborador remoto é ter um foco claro. Isso aumenta a produtividade e eficiência da gestão do tempo. Cabe ao líder ajudar o liderado a priorizar as atividades.
Entre as ações cotidianas de follow-up e comunicação, três pontos se destacam:
Acompanhamento:
O líder não pode se distanciar das equipes, mesmo que virtualmente. Para isso deve manter uma conduta recorrente de acompanhamento das pessoas, de maneira individualizada e coletiva. Claro que isso não significa ficar colado no funcionário controlando suas atividades e tarefas, mas sim, acompanhar os resultados, o andamento dos projetos e ajudar a destravar as dificuldades.
Apoio:
O líder remoto deve ser um orientador e norteador de caminhos. Além disso deve se mostrar disponível para apoiar nas questões que garantem os bons resultados e, entre eles, até mesmo algumas questões pessoais como insegurança, ansiedade e cuidados com a saúde e qualidade de vida.
Feedback:
Esse é um dos pontos em que a liderança brasileira mais precisava desenvolver antes mesmo dos modelos de teletrabalho. Agora virou algo urgente. O líder deve ter uma rotina de feedbacks constantes, programados e eventuais, que ajudam os liderados a perceberem o quanto estão acertando e em quais pontos precisam se desenvolver.
Como vemos, a liderança precisa continuamente aprender e se desenvolver e, em um mundo de mudanças tão aceleradas, isso passa a ser uma obrigação para o sucesso nos novos tempos.
Marcelo de Elias é conteudista sobre mudanças, é professor da Fundação do Cabral, FGV, Franklin Covey e Disruptive MBA. Fundador da Universidade da Mudança e mestre em inovação e design.
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