Mudanças são de dentro pra fora ou de fora pra dentro? Para não errar, o caminho é responder do jeito mais fácil: depende!
Brincadeiras à parte, realmente depende do que estamos querendo saber. Se estivermos falando sobre a força motriz das mudanças, ou seja, quem é capaz de fazer a mudança acontecer, fica fácil perceber que ela depende das pessoas. Pessoas são motivadas a algum tipo de ação, seja qual for, sempre de “dentro para fora”.
Isso significa que a decisão de mudar e a ação específica para fazer a mudança acontecer legitimamente é dependente da vontade íntima da pessoa. Nesse caso, a mudança acontece de dentro pra fora.
Se estivermos pensando nas razões que podem estimular as pessoas a mudarem, aí sim elas podem estar tanto do “lado de dentro” (motivo pessoal) quanto do “lado de fora” (motivado pelo contexto).
Se acreditarmos que as mudanças só acontecem de dentro pra fora, a gente começa a achar que não tem absolutamente nada que possamos fazer. Depende apenas do indivíduo. Dessa forma, a gestão da mudança seria quase uma questão de sorte, em que precisaríamos torcer para que as pessoas desejem fazer as mudanças.
É por isso que o profissional de gestão da mudança precisa entender que, mesmo que a força da mudança seja de dentro pra fora, nós precisamos considerar os dois caminhos para que possamos estimular as transformações.
Vou explicar melhor. Vamos supor que na sua empresa uma determinada atividade deixará de existir, fazendo que muitos cargos não sejam mais necessários. Você, que gosta da empresa e não quer perder o emprego, rapidamente se antecipa e começa a aprender outras atividades, visando conseguir um cargo em outro processo essencial do negócio.
Nesse caso a decisão da mudança é sua, correto? Mas o que estimulou a mudança foi um fator externo a você. Algo que aconteceu na empresa. Chamamos isso de mudança exógena.
Vamos agora pensar em outra situação: suponha que você já não goste mais do trabalho que faz. Vai para a empresa sem motivação e o trabalho parece que só esgota sua energia. Você já não está mais feliz.
Nesse contexto, espontaneamente, mobilizado por um sentimento de propósito ou de resultados que deseja alcançar, você começa a estudar sobre outras atividades e novos processos, visando mudar de função dentro da sua empresa ou até mesmo mudar de emprego.
O exemplo é parecido com o anterior, mas, nesse caso, o que mobilizou a mudança foi algo interno, íntimo e altamente protagonista. Não precisou que alguma mudança empresarial acontecesse para você começar a mudança. O motivo está aí dentro. Certamente é algo relacionado aos seus sonhos, crenças, valores, desejos pessoais, necessidades íntimas de autorrealização ou de desenvolvimento.
Chamamos essas de mudanças endógenas.
Mas por que é importante saber isso? Justamente para que sejamos capazes de responder a seguinte pergunta: qual dessas duas mudanças é mais potente? Se os fatores exógenos ou endógenos são motivadores das mudanças, qual deles eu preciso usar na gestão da mudança?
A resposta é simples. O jeito mais potente é usar os dois fatores ao mesmo tempo.
O que eu quero dizer com isso é que você pode, e deve, gerar razões e motivos “externos” para que as coisas aconteçam enquanto que, simultaneamente, trabalha os fatores “internos”, como as crenças pessoais, as formas de ver as mudanças, a capacitação para lidar com elas.
Use os mecanismos e ferramentas de comunicação interna e as lideranças para sensibilizarem as pessoas para perceberem que a empresa precisa das mudanças e também compreenderem o quanto essas mesmas transformações podem ser importantes para cada uma delas.
Tenho uma dica adicional que compensa você não esquecer:
“Faça a mudança exógena parecer-se com uma mudança endógena”
As pessoas são mais espontaneamente motivadas e tornam-se mais engajadas com as mudanças endógenas. É provável que, com ela, a mudança seja mais potente, para a maioria das pessoas, já que essas são “mudanças autorais”.
É certo que algumas delas vão precisar de um empurrão externo para que sejam mobilizadas, tudo bem… mas, não temos dúvidas de que as mudanças se tornam mais leves, e ao mesmo tempo, mais fortes, quando nascem de um propósito ou objetivo pessoal.
Para fazer isso, um possível caminho é envolver as pessoas na construção das ações das mudanças e para que participem com ideias para as lacunas que se abrem quando a empresa muda.
Em vez de impor todas as ações necessárias, é interessante pensar em alguns passos onde seja possível contar com a participação das pessoas, ou, ao menos, de alguns representantes-chave.
Nesse aspecto, envolver os líderes é algo necessário. Saiba que eles costumam ser os maiores “sabotadores” das mudanças quando não se sentem envolvidos.
Por outro lado, quando sentem que os próximos passos podem ter um pouquinho da impressão digital de cada um, o engajamento é bem maior. Nesse caso eles atuam como “agentes da mudança” e podem ser os embaixadores das novidades.
Eu sei que isso não vai se aplicar a tudo. Tem coisas que são definidas pela alta administração e que precisam ser obedecidas, sem espaço para conversar ou opinar, mas, mesmo em situações dessas, é importante, propositalmente, incluir alguns fóruns de discussão, programas de sugestões, reuniões de brainstorming e também utilizar a própria equipe para criar e gerir os projetos que impactam positivamente nos objetivos da mudança já definida.
Dessa forma, boa parte daquilo que deveria ser “engolido a seco” passa a contar com a participação das pessoas e, assim, sentindo-se como parte protagonista, elas têm o sentimento que a mudança também partiu delas, ou seja, a mudança é endógena.
Esse é um caminho para aumentar o comprometimento, o engajamento e minimizar resistências.
Marcelo de Elias é mestre em inovação e design. Conteudista especialista em mudanças, é professor da FGV, FDC e outras escolas de negócios. Escritor e fundador da Universidade da Mudança.
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